Journal De Bruxelles - 'Grito de Dolores', Sheinbaum escreverá página histórica para as mulheres no México

'Grito de Dolores', Sheinbaum escreverá página histórica para as mulheres no México
'Grito de Dolores', Sheinbaum escreverá página histórica para as mulheres no México / foto: Carl de Souza - AFP/Arquivos

'Grito de Dolores', Sheinbaum escreverá página histórica para as mulheres no México

Claudia Sheinbaum se tornará, nesta segunda-feira (15), a primeira mulher a conduzir a festa de Independência do México da varanda presidencial, uma tradição dominada por homens por mais de um século neste país com machismo arraigado.

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A mandatária, que em 2024 triunfou nas urnas para se tornar a primeira presidente do México, protagonizará à noite o chamado "Grito de Dolores", que encena o chamado à insurreição lançado pelo padre Miguel Hidalgo em 1810.

"Pela primeira vez, uma mulher vai dar o Grito, é bastante inovador", disse, sorridente, a presidente de esquerda na última quinta-feira quando lhe perguntaram sobre o seu sentimento em relação ao evento.

Desde que assumiu o poder em 1º de outubro de 2024, Sheinbaum se apresenta como "presidenta com 'a'" e como "comandanta" das Forças Armadas, às quais passa revistas usando roupas com bordados indígenas coloridos. Os oficiais militares também a chamam assim.

A apresentação desta física de 63 anos para agitar a bandeira nacional e tocar um sino antigo diante de milhares de pessoas no Zócalo — principal praça pública do país — não é apenas um fato histórico, mas carregado de simbolismo.

"Abre um espaço que estava tacitamente vedado para as mulheres", disse o historiador mexicano Lorenzo Meyer à AFP.

Além disso, ratifica que a sociedade mexicana finalmente aceitou que nas cúpulas do poder político "o gênero não importa", destacou.

- Talento -

Embora tenha dito que será uma cerimônia simples, Sheinbaum, cuja popularidade ultrapassa os 70%, ensaiou alguns passos para o "Grito", que considera um ato "emotivo e fundamental".

"Já senti o sino", comentou sobre o instrumento tocado pelo padre Hidalgo, que coroa a varanda presidencial.

Durante o discurso, os governantes costumam exclamar vivas e rejeições que refletem seu ânimo.

O de Sheinbaum se tornou evidente na maneira como lidou com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com quem mantém uma relação fluida apesar de suas posições duras em relação ao México.

A mandatária receberá a bandeira das mãos de uma escolta militar, para então encorajar a multidão que costuma desafiar as noites chuvosas de setembro para responder "Viva México!".

Na próxima terça-feira, Dia da Independência, liderará um desfile militar no centro da capital.

- Origem disputada -

Sheinbaum seguirá os passos Hidalgo, "pai da pátria", cujo chamado foi a faísca do processo que levou à independência da então Nova Espanha em 1821.

Segundo as crônicas da época, militares, advogados, comerciantes e religiosos se reuniam clandestinamente para planejar uma revolta contra a Coroa.

Mas, ao serem descobertos durante a madrugada, Hidalgo pegou um estandarte da Virgem de Guadalupe e, do átrio da igreja de Dolores, em Guanajuato (centro), tocou o sino para chamar à sublevação.

"Viva nossa Santíssima Mãe de Guadalupe! Viva Fernando VII e morra o mau governo!", exclamou o padre diante de uma multidão em defesa do rei espanhol, derrubado pela invasão napoleônica da Espanha.

Hidalgo comandou a luta até sua execução por fuzilamento em 1811. Cortaram sua cabeça para pendurá-la, junto com as de outros três independentistas, na Alhóndiga de Granaditas, Guanajuato.

Apesar da aceitação deste relato, a origem do "Grito" é imprecisa. O historiador Meyer assegura que, aparentemente, foi promovido por outro invasor: Maximiliano de Habsburgo, imposto como imperador do México (1864-1867) durante a intervenção francesa.

"Maximiliano, se não inventou a comemoração, pelo menos a consolidou", disse Meyer.

Porfirio Díaz, que governou por três décadas até a Revolução de 1910, institucionalizou o ato na noite de 15 de setembro de 1896 para que coincidisse com seu aniversário. Com esse objetivo, ele transferiu para a capital o sino que Sheinbaum fará ressoar.

R.Cornelis--JdB