

Dependentes mexicanos, na mira de traficantes em centros de reabilitação
Dependentes mexicanos que querem superar seu vício depositam sua "esperança" em centros de reabilitação onde, no entanto, correm riscos, já que traficantes muitas vezes vão procurá-los nestes locais, como acontece no estado de Guanajuato, o mais violento do México.
Estes locais, muito frequentados por ex-usuários de entorpecentes e vários deles irregulares, são cenários frequentes de ataques a tiros pelo crime organizado, especialmente nesse estado do centro do país.
Alguns internos são procurados por traficantes com os quais têm dívidas, explica Nicolás Pérez à AFP, que dirige uma rede de 180 centros de reabilitação em Guanajuato.
Com 55 anos, Pérez aponta que recebeu ligações extorsivas de supostos criminosos, que pedem para entregar alguns dos internos dos centros que coordena.
Nem os líderes desses centros estão seguros. Três responsáveis de um deles, popularmente chamados de "anexos", desapareceram em 2 de junho após participar de uma reunião da rede dirigida por Pérez.
Após o desaparecimento, os internos que estavam no centro de reabilitação sob sua responsabilidade foram devolvidos às suas famílias.
Em outros casos, cartéis matam os internos por suspeitar que foram recrutados por bandos rivais, acrescenta David Saucedo, analista em temas de segurança.
Um dos piores massacres ocorreu em julho de 202, quando um comando armado assassinou a tiros 26 pessoas em uma clínica no município de Irapuato. Em abril, um ataque armado contra um centro de reabilitação no estado de Sinaloa (noroeste) deixou nove mortos.
- "Sempre há esperança" -
"Ainda com medo, a gente busca ajuda", afirma Pérez, de 55 anos, que sofreu de alcoolismo e dependência de drogas há 20 anos. Hoje ele garante que o que o motiva é sua família. "Sou pai, avô e não gostaria de deixar essa maldita herança de ignorância".
"Sempre há esperança", afirma Azucena, uma voluntária que diz ter encontrado no centro sua "maior recompensa".
A mulher, que preferiu reservar seu sobrenome por segurança, parou seu consumo há onze anos em um anexo da cidade de Celaya, onde agora compartilha com internos tarefas domésticas, exercícios e reuniões.
Javier Torres, de 44 anos, também deixou as drogas nessa clínica e agora guia outros dependentes. Após 10 anos de abstinência, recuperou seu trabalho como professor do ensino fundamental e a relação com sua filha, "o melhor prêmio".
Só em Guanajuato, as clínicas passaram de 150 em 2016 a 290 atualmente. "Começamos a nos profissionalizar", afirma Pérez, ao estimar que um quinto das pessoas que atende se reabilitam.
Pérez disse que está certificado como conselheiro em dependências. Nos centros que coordena, um médico supervisiona os períodos de abstinência dos internos.
Reconhece que décadas atrás eram aplicados castigos, como obrigar aqueles que recaíam a permanecerem ajoelhados.
Em Guanajuato, os vícios aumentam com a oferta de drogas.
No primeiro semestre de 2015, 10,4% dos solicitantes de tratamento nos Centros de Integração Juvenil (CIJ, instituição de participação estatal) desse distrito declararam ter consumido metanfetamina nos últimos 30 dias.
Em 2018 esse indicador triplicou para 32,7% e em 2021, atingiu um pico de 41,3%, superando a maconha (37,7%).
Atualmente, o estimulante é "a principal substância pela qual se solicita atenção", disse Nadia Robles, funcionária da governamental Comissão Nacional de Saúde Mental e Dependências.
- Guerra entre cartéis -
O aumento dos vícios nesse estado é resultado da guerra travada pelo cartel Jalisco Nueva Generación (CJNG), designado em fevereiro como "organização terrorista estrangeira" pelo governo dos Estados Unidos, e pela máfia local Santa Rosa de Lima, explica o analista David Saucedo.
Entram em conflito e, para financiar essa guerra cara de cartéis, ampliam sua base de consumo", acrescenta.
Ambos disputam o controle da rede rodoviária que atravessa Guanajuato e conecta com dois locais-chave para o tráfico de drogas: a fronteira com os Estados Unidos e o porto de Manzanillo, no Pacífico, destino de precursores químicos para fabricar drogas sintéticas provenientes da Ásia.
As quadrilhas de narcotraficantes também lutam para conquistar dois importantes mercados de entorpecentes, acrescenta Saucedo. O corredor industrial, que abriga fábricas de montagem de automóveis como Mazda e Toyota, e a cidade turística de San Miguel de Allende, frequentada por viajantes americanos.
No âmbito dessa espiral violenta, Guanajuato foi o estado com mais homicídios no México. Em 2024, registrou mais de 3 mil assassinatos de um total de 30 mil.
S.Vandenberghe--JdB