

Com seu filme sobre Gaza, Kaouther Ben Hania quer revoltar o público
"Eu não fiz este filme para que as pessoas fiquem confortavelmente em seus assentos", afirma a diretora franco-tunisiana Kaouther Ben Hania, que apresentou o impactante filme "The Voice of Hind Rajab" no 82º Festival Internacional de Cinema de Veneza.
O longa, sobre a morte de uma menina de cinco anos na Faixa de Gaza, provocou uma imensa comoção no Lido veneziano.
O filme é baseado na história real de uma menina palestina, Hind Rajab, assassinada pelas forças israelenses enquanto tentava fugir da Cidade de Gaza.
Nele, são recriadas as longas horas vividas em 29 de janeiro de 2024 em um centro de emergências do Crescente Vermelho palestino em Ramallah, na Cisjordânia, cujos trabalhadores tentaram salvar a criança, refugiada em um carro junto com seis familiares.
Foram utilizados no filme gravações reais da chamada telefônica em que Hind Rajab pedia socorro.
Quando ouviu essas gravações pela primeira vez, que haviam sido divulgadas na imprensa, a cineasta afirma que sentiu "muita raiva, muito desespero". "Mas algo também me disse: 'o que eu posso fazer?'", contou.
"Os habitantes de Gaza, os palestinos em geral, sempre são considerados suspeitos antes de serem vítimas", acrescentou em uma entrevista à AFP a diretora de "As 4 filhas de Olfa" (2023).
- Produtores ameaçados -
Na quarta-feira, quando terminou a exibição oficial do filme, com a presença dos atores Joaquin Phoenix e Rooney Mara, ambos produtores executivos, uma multidão emocionada ovacionou a obra por 23 minutos. Algo nunca visto.
Brad Pitt também ofereceu seu apoio, assim como Jonathan Glazer, diretor premiado com o Oscar por "A Zona de Interesse" (2023). Os dois receberam ameaças, segundo a diretora.
"Entre ontem e anteontem, meus produtores, incluindo nomes americanos muito conhecidos, como Brad Pitt, Joaquin Phoenix; suas caixas de entrada de e-mail foram inundadas com milhares e milhares" de mensagens, disse Kaouther Ben Hania nesta sexta-feira. Foram textos "superintimidantes", acrescentou, prevendo que isso deve ser apenas "o começo".
O filme já foi selecionado para representar a Tunísia no Oscar de 2026.
A pré-estreia em Veneza, um potencial trampolim para o Oscar, "é muito importante (...) porque, para um filme como este, permite uma visibilidade enorme. E eu quero que o filme seja visto um pouco por todo o mundo", declarou.
- Dar um rosto -
O longa-metragem deve ser lançado nos cinemas em 17 de setembro na Tunísia, mas, por enquanto, ainda não há nenhuma data prevista na Europa. Nos Estados Unidos, ainda não tem distribuidora.
Divulgando mais amplamente possível seu filme, Kaouther Ben Hania busca "dar um rosto a essa menina e também aos trabalhadores do Crescente Vermelho". "Com essa história, podemos perceber a enormidade e a monstruosidade do que está acontecendo" em Gaza, diz.
No filme, ela quis exibir a praia de Gaza porque a mãe de Hind Rajab - que aparece no final da narrativa - contou que a menina adorava ir lá.
"E quando você vê alguém como [o presidente dos Estados Unidos, Donald] Trump falando sobre a Riviera, me pergunto: 'em que mundo estamos vivendo?'", comenta.
A mãe de Hind Rajab deu sua "bênção" para que o filme fosse feito, com o desejo de que "a voz de sua filha não fosse esquecida".
Os funcionários do Crescente Vermelho conversaram por muito tempo com os atores palestinos que os interpretaram no filme, rodado na Tunísia.
"The Voice of Hind Rajab" será exibido nos festivais de Toronto, Londres, San Sebastián e Busan.
O.M.Jacobs--JdB