

Países petroleiros bloqueiam negociações para tratado global contra contaminação por plásticos
Vários países produtores de petróleo que rejeitam qualquer restrição sobre a produção de plásticos estão bloqueando os esforços de negociação em Genebra para o primeiro tratado mundial contra a poluição por plástico, informaram à AFP várias fontes envolvidas nas conversações.
"Estamos em um diálogo de surdos, com pouquíssimas pistas de pouso", disse uma fonte diplomática de um país da coalizão chamada de "ambiciosa", que deseja impor no texto final objetivos de redução da produção de plástico virgem (não reciclado).
Uma proposta rejeitada por outro grupo de países, principalmente os produtores de petróleo. O projeto de tratado, o primeiro sobre a questão juridicamente vinculante, busca regulamentar a produção, o consumo e o destino final do plástico em nível mundial.
A cada ano, 22 milhões de toneladas de resíduos plásticos são despejadas no meio ambiente, contaminando solos, oceanos, prejudicando a biodiversidade e, inclusive, penetrando nos tecidos humanos.
Um total de 184 dos 193 países que integram a ONU participam da nova rodada de negociações, organizada após o fracasso das conversações do final de 2024 em Busan, Coreia do Sul.
"As posições estão se cristalizando", confirmou à AFP uma fonte de uma ONG que participou de várias sessões a portas fechadas.
Os documentos apresentados pelas delegações mostram que a Arábia Saudita, os países árabes, a Rússia e o Irã, que dizem "compartilhar as mesmas ideias" em um grupo chamado "like minded" ('ideias semelhantes'), rejeitam qualquer medida vinculante sobre a produção de plástico.
Estas nações desejam que o tratado não inclua a origem petrolífera do plástico, concentrando-se somente na fase final, quando se transforma em resíduo, com medidas como o financiamento da coleta, classificação e reciclagem, em particular nos países em desenvolvimento.
O texto inicial para abrir as negociações, no entanto, aponta "todo o ciclo de vida" do plástico.
- Disputa -
Segundo a fonte diplomática, se o texto servir apenas para ajudar os países em desenvolvimento a administrarem melhor os resíduos, "não precisamos de um tratado internacional". "Estamos diante de uma disputa com países dispostos a que não exista um tratado", explicou.
Também não há consenso sobre o artigo 3 do futuro tratado, que estabelece uma lista de substâncias químicas consideradas potencialmente perigosas para o meio ambiente ou a saúde humana, como aditivos, corantes, poluentes chamados "eternos" (PFAS) ou ftalatos.
"Alguns não querem nenhuma lista, ou que cada país possa fazer sua própria lista de produtos perigosos, o que já pode ser feito sem necessidade de um tratado internacional", aponta a mesma fonte, que também se mostra surpresa "com a falta de abertura da China".
A China é o maior produtor mundial de plástico e representa 34% dos quatro polímeros mais comuns — polietileno (PE), polipropileno (PP), politereftalato de etileno (PET) e poliestireno (PS) — segundo a consultoria ambiental britânica Eunomia.
O maior produtor mundial de plástico é o grupo estatal chinês Sinopec, que fabrica 5,4% das quatro moléculas.
"Isto não é uma negociação, é uma situação de tomada de reféns, sobretudo quando você sabe que está ficando sem dinheiro, as pessoas querem terminar o processo. Estão tentando nos esgotar", assinalou Cate Bonacini, porta-voz da ONG CIEL, em alusão aos países "ike-minded", grupo formado por muitos países produtores de petróleo.
"No primeiro dia, ouvimos os países questionando se deveria haver um tratado sobre plásticos. Isto é algo realmente indicativo de em qual posição alguns países estão", afirmou à AFP.
- Riscos para a saúde -
A Organização Mundial da Saúde (OMS), por sua vez, instou os países a garantirem que o tratado contenha disposições para reforçar a proteção sanitária da população.
"A contaminação por plásticos traz riscos importantes e crescentes para a saúde humana", disse o chefe da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, à imprensa.
"Estes riscos têm um impacto desproporcional na população vulnerável, incluindo trabalhadores (...) e comunidades próximas de locais de extração, produção e eliminação", acrescentou.
"Muitos dos [componentes] químicos que se adicionam ao plástico durante sua manufatura são perigosos, incluindo disruptores endócrinos, relacionados com desequilíbrios hormonais, problemas reprodutivos, infertilidade, doenças reais e câncer", explicou.
P.Mathieu--JdB